Encontrei uma carta muito bonita. Muito bonita de verdade. Foi escrita especialmente para mim.
Mas não foi uma carta pensada e repensada por alguém, dessas que navegam pelos correios até chegar ao seu destino. Foi uma que navegou de verdade e chegou aqui, mesmo sem saber que o seu destino era eu.
Era eu sim.
Fiquei surpreso e emocionado de tal forma que dela não consigo tirar os olhos até hoje. Nem quero. É uma carta bonita e caprichada. Cheia de um lado a outro com palavras que não parecem terem sido escritas, mas desenhadas.
Tão gentil quanto a beleza das palavras é o papel que as transporta. Resistente e denso, mas macio como o veludo. É também muito cheiroso e perfumado.
Cada palavra desta carta percorre seu papel com harmonia e, do começo ao fim, parece uma estrada reta, macia, daquelas de onde partimos com a total certeza de chegar lá, aonde quer que nos leve.
É o meu papel. Aqui escreveram a minha carta.
E o mais curioso é que, de todo aquele texto que se deita majestoso sobre o sublime papel, não entendo palavra. Não parece um texto complexo ou rebuscado, mas é texto dos que não se entende com esforço nem nada.
Não veio em língua de gente, veio em língua de carta.
Sem pena ou tinta de caneta, grafite ou carvão. Um texto legível como só, mas de tão bem escrito e cheio de alma, não possui tradução.
Pode buscar em livros e dicionários. Correr por todo o mundo buscando quem o decifre, batendo de porta em porta atrás das línguas mortas. Mas de morto esse texto não tem nada.
É preciso vê-lo para crer. Acreditem em mim. Este texto não mente.
É texto lógico que percorre caminhos. Chega para ser lido pela mente e acaba se alojando no coração.
Fiz que fiz para escutá-lo, mas acabei encantado. Como era pra ser. Como estava escrito.
E depois de percorrido esse caminho, meu coração, tão ridiculamente inocente, deixou a mente de lado e passou a buscar os significados desse texto, que apaga seu rastro da memória sem piedade. Faz o leitor esquecê-lo a cada palavra, antes mesmo de começá-lo.
Um texto que não quer ser compreendido.
E assim sofreu ingenuamente meu coração por não entendê-lo. Por achar que deveria. Por tanto tempo.
Um coração que não desiste daquilo que acha certo. Que precisava compreender esse texto a qualquer custo. Pensava como podia ser cruel um texto esconder tanto a sua beleza daquele que o quer tão bem.
Mas enquanto isso meu coração foi vivendo. Buscando compreender esse texto que não quer ser compreendido. Foi tratado e medicado pelo senhor tempo.
E hoje sabe que o texto que não deseja ser lido deve ser apreciado apenas. Deve ser acompanhado de perto, amado e querido para ser compreendido.
Foi quando meu coração finalmente entendeu. Meu ouvido se acalmou. Meus dedos encontraram o ritmo perfeito sobre as suas sentenças. E a mente concordou.
Que um texto que não quer ser lido não pode ser lido. Deve ser amado e compreendido apenas pelo bem que traz a sua beleza. Pelo dom de existir e ter-me encontrado.
O texto que não quer ser lido deve-se entender sem palavras.
Se não for assim,
Perde a poesia.
2 comentários:
Não precisa levar o texto tão ao pé da letra assim!
Você sabe o que ele quer, isso é que importa!
Te amo!
Lindo seu texto!
Ambos! :-)
Obrigado, linda.
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